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Apps e sites usados em aulas online no Brasil coletaram dados privados de crianças

Apps e sites usados em aulas online no Brasil coletaram dados privados de crianças

25 de Maio de 2022

Desde que a pandemia empurrou as aulas da escola para os meios digitais, milhares de crianças passaram a ter dados privados, como sua localização e comportamento online, coletados por sites e aplicativos usados no acesso a conteúdos educativos, seja de maneira declarada, seja secretamente.

É o que aponta uma investigação internacional da Human Rights Watch (HRW) que analisou 165 produtos para educação à distância usados em 49 países, inclusive no Brasil, durante a pandemia da Covid-19 e recomendados por governos locais para professores, pais e alunos.

São sites e aplicativos dedicados à educação de crianças e adolescentes que surgiram quando as instituições de ensino fecharam as portas, ou que foram adaptados à nova demanda urgente. As empresas que desenvolvem esses produtos são genericamente chamadas de edtech, flexão de educação com tecnologia em inglês.

O estudo aponta que 89% deles "colocava em risco ou diretamente violava a privacidade e outros direitos de crianças e adolescentes para finalidades não relacionadas à sua educação''. Dos nove produtos brasileiros analisados, um colocava em risco a privacidade dos alunos e oito a violavam, segundo a Human Rights Watch.

São eles: Estude em Casa, da Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais; Centro de Mídias da Educação de São Paulo, da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo; Descomplica, Dragon Learn, Escola Mais, Explicaê, Manga High, Stoodi e Revista Enem –este último sendo o único que apenas coloca em risco os dados dos estudantes.

"Crianças estão tão sujeitas à vigilância e ao monitoramento em suas classes virtuais quanto adultos fazendo compras nas maiores lojas virtuais do mundo", ilustra o texto do relatório, lançado nesta semana por um consórcio internacional de jornalismo investigativo chamado Edtech Exposed, do qual o jornal Folha de SP faz parte e que é integrado por outros 12 veículos de mídia de 16 países.

O consórcio foi coordenado pela ONG The Signals Network, que apoia delatores que revelem informações sobre a má conduta de corporações e violações de direitos humanos.

Na maior parte dos casos analisados pelo relatório da HRW, os produtos ensinavam matemática e inglês, por exemplo, ao mesmo tempo em que coletavam informações dos estudantes e as compartilhavam com outras empresas, tais como gigantes de tecnologia, como Google e Facebook, além de corretores de dados (ver glossário nesta página) e companhias de publicidade digital.

E, num contexto de pandemia, o poder de decisão de pais e alunos em relação ao uso ou não destes dispositivos ficou extremamente restrito.

Com exceção do Estude em Casa, todos os outros sites e aplicativos foram recomendados pelo governo de São Paulo. Bruna Waitman, coordenadora do Centro de Mídias da Educação de São Paulo, afirmou que os desenvolvedores de todas essas plataformas "assinaram um termo de confidencialidade indicando que nenhuma informação adquirida pode ser usada de nenhuma forma, o que implicaria em responsabilização administrativa, civil ou criminal".

As análises do estudo da HRW foram feitas entre março e agosto de 2021 e representam uma fotografia da prevalência e frequência com que tecnologias de monitoramento são inseridas em cada produto naquele momento –algo que pode ter sido modificado desde então.

De 164 produtos analisados, 147 deles (89%) monitoravam o comportamento de estudantes nos meios digitais, coletando dados sobre quem eles são, onde estão, que aparelho utilizam, o que fazem na sala de aula e quem são seus amigos.

O estudo identificou que há mais empresas recebendo dados de alunos do que compartilhando-os: 147 produtos enviavam dados para 199 empresas de tecnologia de publicidade online.

"Isso permite que os algoritmos sofisticados dessas empresas de tecnologia de anúncio costurem dados e os analisem em conjunto para inferir características pessoais e interesses das crianças que sugiram como elas podem ser influenciadas", explica Hye Jung Han, pesquisadora sobre tecnologia e direitos das crianças da Human Rights Watch nos EUA.

"São informações que podem ser comercializadas para qualquer um com interesse nesse público-alvo."


Texto de Fernanda Mena Paula Soprana | Folha de SP
Imagem: Catarina Pignato

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